Corria pela
rua acima quando a boca bedju fez de mim um espantalho. Não era preciso plantar
o milho, nem afugentar o santchu para dar conta do meu espanto e dos gritos
ensurdecedores que povoavam o universo do bairro. O grito era imponente,
valente. Seguia em vaga de screem que levava a sua irra ao parlamento e palácio
do governo. No horizonte, as estrelas cadentes cruzavam num ritmo frenético,
riscando as letras da vida, uma nova alma em viagem. Na terra firme, os
responsáveis da terra, dormia num eco de silêncio.
A irra da
boca bedju fez o meu corpo estremecer. Engoli em seco, o meu coração dançava em
batucada de inquietação e de medo; o meu coração não parava de «tuntunar».
Algures, naquele momento, a Josefa desatinava aos gritos, choros estridentes
que pesam na memória; a sua voz começara a deslizar na onda cartesiana que teve
a harmonização nalgumas vizinhanças. A casa da Dona Segunda era o local de
romaria. O ambiente era pesado, confuso. Há muito que não se ouvia tamanho
prenúncio da desgraça no bairro. O vento trazia a música da desgraça: «Ai
Pedrinho, Ai Pedrinho…Ai Pedro». O Pedrinho era a vitima de uma emboscada
perpetrada por um grupo de thug; dos seus 47 anos, Pedrinho era o profeta e
polícia do bairro. Era ele que se encarregava de levar o alho e a arma de prata
para caçar os vampiros do bairro. Qualquer sinal de denúncia, o Pedrinho ou
chamava a polícia ou dava curativos nos bandidos. Por ser altruísta levou o
«troco» por defender a comunidade.
O seu corpo
parecia uma escultura de pirâmide de Egito. Homenzarrão que não condizia com o
seu nome; 2 metro de porte, peitudo e de mãos largas, com a cara de Malcom X.
Da sua escultura jorrava os fluidos que serpenteavam na planura vermelha de
chão ferroso. O vermelho do chão lacrara uma vida perdida.
(...)